Discriminação Interseccional na Corte Interamericana de Direitos Humanos
uma análise de suas sentenças
Resumo
A interseccionalidade, conceito jurídico elaborado em 1989 por Kimberlé Crenshaw, visa abordar como a confluência de dois ou mais vetores de discriminação pode recair sobre um mesmo indivíduo, dando origem a uma inédita forma de discriminação. O Sistema Interamericano de Proteção de Direitos Humanos, sobretudo a partir dos principais órgãos da Organização dos Estados Americanos, passa a se valer de teorias de discriminação como a interseccionalidade para compreender essa confluência, a fim de se adaptar frente aos desafios que se impõem à plena efetivação da dignidade humana. O objetivo deste artigo é compreender e analisar a construção e afirmação teórica e a aplicação da interseccionalidade na qualidade de teoria da discriminação por parte da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Para tanto, realiza-se pesquisa qualitativa por meio do método indutivo, empregando-se as técnicas de revisão de literatura especializada e análise jurisprudencial. Conclui-se que o conceito de interseccionalidade empregado pela Corte Interamericana se encontra em harmonia com o desenvolvimento teórico acadêmico sobre a matéria, especialmente em relação à dimensão qualitativa da discriminação interseccional. No entanto, ainda há espaço para aprimoramento e necessidade de se debruçar sobre a delimitação conceitual do caráter estrutural da interseccionalidade, visando fins práticos imediatos e futuros que busquem garantir a eficácia desta teoria enquanto instrumento e método para a defesa dos direitos humanos e a tutela efetiva da dignidade humana.
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